Visão Retrógrada do Governo Desqualifica Bombeiros Versão para impressão
Sexta, 08 Outubro 2010 18:53

Plenário Nacional de BombeirosAs propostas do Governo para a criação das carreiras especiais de bombeiros profissionais são retrógradas, desvalorizam a carreira e não respondem minimamente às propostas sindicais entretanto apresentadas. O STML e o STAL repudiam este projecto, tudo farão para o combater e irão, seja no âmbito do processo negocial seja no plano reivindicativo, continuar a bater-se por propostas justas e realistas que valorizem e dignifiquem os bombeiros profissionais.

O projecto governamental, entregue em 14 de Setembro, visa regular as Carreiras Especiais de Bombeiros Profissionais em corpos de Bombeiros detidos e mantidos na dependência de municípios e foi enviada após um longo período de atrasos sistemáticos neste processo negocial, para o qual o STML e o STAL têm insistentemente exigido celeridade e apresentado propostas concretas.

Os sindicatos enviaram já ao Governo um parecer crítico a este projecto no qual consideram que o mesmo não responde minimamente às propostas que temos apresentado e, naturalmente, às expectativas dos profissionais do sector, constituindo mesmo uma visão retrógrada das relações de trabalho, como se nada de especial relevância tivesse acontecido no dia 25 de Abril de 1974.


Plenário Bombeiros em LisboaNo parecer enviado, o STML e o STAL consideram que com esta proposta o Governo perde uma oportunidade de dar passo em frente em relação às primeiras propostas apresentadas, já de si extremamente prejudiciais para os trabalhadores actualmente afectos aos bombeiros municipais e sapadores, particularmente tendo em conta as propostas que estas duas estruturas sindicais em tempo oportuno lhe fizeram chegar. Consideram aliás que em muitos aspectos constituem mesmo um retrocesso grave em relação à actual legislação no sector e, tão grave quanto isso, manifestam uma incapacidade total do governo para reflectir os anseios dos profissionais do sector e as propostas sindicais entregues.»

Os Sindicatos afirmam ainda que aquele projecto de diploma «aprofunda a notória falta de respeito que o actual Governo desde sempre tem manifestado pelos bombeiros profissionais.


Ataque ao vínculo público

É proposta a criação de duas carreiras especiais de bombeiros profissionais dos corpos de bombeiros detidos e mantidos na dependência de municípios – a carreira de Oficial Bombeiro e a carreira de Bombeiro – mas sem estatuto de vínculo público, pelo que os bombeiros profissionais passarão a estar abrangidos pelo Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas.

O STML e o STAL questionam: Será que não estamos perante importantes e fulcrais corpos de segurança de pessoas e bens no País? Não faz sentido que, mesmo à luz da já de si restritiva e condenável filosofia que coloca as forças de segurança no grupo de funções abrangidas pelo regime de emprego com vínculo público, por analogia também os bombeiros integrem este grupo?

Para os sindicatos, com esta mudança prevista pelo Governo procura-se a degradação do dispositivo de Protecção Civil em Portugal, já sobejamente inquinado por graves lacunas, como se tornou dolorosamente óbvio durante o mal afamado período de fogos florestais de Verão este ano.


Carreira Desvalorizada

Tendo como alcance a fusão das actuais carreiras de Bombeiro Municipal e Bombeiro Sapador (aliás, praticamente a única reivindicação destes profissionais e proposta sindical que o Governo aceita, embora, como o provamos, de forma completamente inquinada e desadequada da realidade), o projecto do Governo estabelece que a carreira única de Oficial Bombeiro terá quinze posições remuneratórias, sendo que as categorias de bombeiro e bombeiro chefe da carreira de bombeiro terão, respectivamente, 8 e 5 posições remuneratórias.

Na prática, desta proposta resulta que serão «encaixados» os anteriores 69 escalões em apenas 13 posições remuneratórias. O que se torna ainda mais complicado quando, a cada uma destas carreiras correspondiam Índices 100 com valores diferentes que são agora integrados num novo Índice 100, de valor inferior a qualquer um dos que existiam no anterior regime.

Mas a situação assume contornos ainda mais preocupantes quando nos reportamos à proposta de tabela salarial para as carreiras de bombeiro e de bombeiro chefe, constantes do Anexo do projecto governamental.

Com efeito, o Governo pretende um nivelamento por baixo e desvaloriza drasticamente a carreira de bombeiro profissional, ignorando completamente a função essencial desempenhada por estes trabalhadores e as qualificações técnicas exigidas para o desempenho da mesma.

Veja-se:

- No regime actual, os Bombeiros Municipais iniciam a sua carreira no índice 115, a que corresponde o valor de 551,28 €. - na proposta do Governo prevê-se a entrada na carreira de bombeiro na posição 2 da Tabela Remuneratória Única a que correspondem 532,08 €, ou seja, uma desvalorização de cerca de 20 euros na entrada na carreira.

- Situação mais grave quando pensamos no caso específico dos bombeiros sapadores, que no regime actual iniciam a carreira no índice 154 a que corresponde o valor de 949,56 € - neste caso, a desvalorização proposta pelo Governo é de superior a quatrocentos euros!



Evolução Profissional Bloqueada

O acesso à carreira de bombeiro chefe passa a estar limitado à idade de 45 anos e impossibilita o acesso de Bombeiros Municipais que, estando posicionados nas actuais categorias de Bombeiro de 3ª, 2ª e 1ª já ultrapassaram este limite de idade, pese embora possam possuir um nível de experiência que justamente os aconselharia para funções de chefia operacional.

Estando muitos dos actuais bombeiros nas últimas posições remuneratórias da proposta de tabela apresentada, será pertinente perguntar que tipo de motivação é proposta para estes trabalhadores.


Marcha lenta nas mudanças remuneratórias

Por outro lado, da aplicação das regras do SIADAP conjugada com a integração na tabela remuneratória proposta, significam que, mesmo posições remuneratórias que, à primeira vista, estariam acima dos valores actualmente praticados, passam a estar muito abaixo, porque se altera a regra da progressão de 3 em 3 anos, para instituir a regra constante na actual legislação, que estabelece que só há lugar à alteração obrigatória da posição remuneratória quando o trabalhador obtenha a soma de 10 pontos nas avaliações de desempenho, o que na prática equivale a dizer que esta alteração poderá levar 10 anos, ou mais.

Salienta-se que a aplicação do SIADAP no âmbito dos bombeiros não deixa de ser uma clara indicação que o Governo faz orelhas moucas a todas as criticas que este regime de avaliação de desempenho tem suscitado e, não querendo deixar de lado todas as outras críticas já sobejamente expressas pelo STML e pelo STAL, nomeadamente no que concerne na dificuldade da sua aplicação no âmbito da Administração Local.

Aliás por isso mesmo a proposta do STML/STAL apresentada ao Governo propunha a manutenção do actual regime especial de avaliação dos bombeiros até à negociação e consequente criação de um regime próprio adequado às especificidades destas carreiras especiais.

Efectivamente é curioso notar que este regime parece fazer tábua rasa dos cursos específicos para promoção na carreira, que não têm qualquer referência neste diploma. Ao contrário do que sucede em relação aos bombeiros profissionais das AHBV e aos bombeiros voluntários, os bombeiros profissionais em corpos de bombeiros detidos e mantidos na dependência de municípios precisarão apenas da avaliação para efeitos de progressão e da avaliação conjugada com a antiguidade para efeitos de promoção, conforme decorre do disposto no artigo 8º, apesar de se prever a existência de um curso para acesso a cada uma das categorias das carreiras especiais ora criadas.

Será de questionar se esta medida visa desqualificar ainda mais estes profissionais, o que, se for o caso, certamente irá aumentar o número de acidentes em serviço que já de si é elevado, mas que até agora atingia principalmente os bombeiros profissionais de AHBVs e os bombeiros voluntários.


Disponibilidade permanente

Não bastando os ataques que este projecto governamental encerra, são ainda acrescentadas outras regras que pretendem transformar os bombeiros profissionais em trabalhadores de terceira categoria, com salários que não podem deixar de envergonhar qualquer cidadão consciente, como se as funções por eles desempenhadas fossem de somenos importância e não exigissem especiais conhecimentos técnicos.

É o que acontece com a proposta que estabelece a «disponibilidade permanente para assegurar o Serviço de carácter permanente e obrigatório», através da qual os bombeiros estarão obrigados a prestar serviço naquilo que constitui 99% da sua actividade diária, onde se inclui o transporte de doentes, independentemente de se tratar ou não uma situação de emergência.

Inclui-se neste contexto, por exemplo, a situação dos transportes programados de doentes com dificuldades de mobilidade a hospitais para consultas de rotina.

Na prática, esta abrangência do conceito de disponibilidade assume assim a função de cobertura daquele que é um problema real neste sector: A gritante falta de meios humanos com que as corporações de bombeiros se debatem diariamente, promovendo de forma sub-reptícia o trabalho escravo.


Desprezo pelas funções

Para além da notória desvalorização salarial da carreira, importa realçar também o total desprezo com que é tratada a matéria que diz respeito à compensação pelo trabalho em situações de risco, particularmente se tivermos em conta a norma que estabelece que «as remunerações base correspondentes aos níveis remuneratórios referidos no número anterior integram a compensação pelo ónus específico da prestação de trabalho, risco, penosidade e insalubridade, bem como de disponibilidade permanente, pelo que não pode a esse título ser atribuído qualquer suplemento».

O que, em última análise, se tivermos em conta que o actual valor da salário mínimo nacional é de 475,00 euros (valor esse que será aliás, de acordo com o acordo da Concertação Social, actualizado este ano para os 500,00 euros), terá que nos levar a uma das seguintes conclusões: Ou a carreira de bombeiro, no seu nível de entrada se situa abaixo do salário mínimo nacional; ou o valor que o Governo entende como «justo» para compensar os bombeiros pelo ónus específico da prestação de trabalho, risco, penosidade e insalubridade, bem como de disponibilidade permanente, representa a módica quantia de 25,00 euros!...

Uma ou outra hipótese constituem de facto mais um exemplar sinal do desprezo com que o Governo encara a nobre função que desempenham os bombeiros, sinal esse que se agrava se atentarmos à própria desvalorização que é preconizada para a carreira no seu todo, se comparada com os valores em que se iniciam actualmente as carreiras de bombeiro municipal, já anteriormente identificados.

Por outro lado não se prevê qualquer regra de aposentação específica para estes trabalhadores - mormente que tenha em conta o elevado grau de desgaste a que estão sujeitos ao longo da vida e as condições físicas que se exigem para a maioria das funções que desempenham -, pelo que a aplicação da regra do regime geral da Administração Pública poderá levar, em última análise, a termos trabalhadores integrados na carreira especial de bombeiro, com a categoria de bombeiro, a combater um incêndio florestal, por exemplo, na linha da frente deste com 65 anos de idade.

Uma tal noção é por si só reveladora do total desconhecimento das condições operacionais das funções desempenhadas por estes trabalhadores e/ou de um total desprezo pela dignidade do ser humano, particularmente daquela que diz respeito à atenção e ao cuidado que um bombeiro deveria merecer no final de uma vida de dedicação à causa pública que representa a salvaguarda da segurança de pessoas e bens.



Plenário Bombeiros em LisboaO STML e o STAL continuarão a bater-se pela proposta que atempadamente apresentaram ao Governo, contra as malfeitorias que este projecto de diploma encerra.

Neste sentido, realizar-se-á, no próximo dia 20 de Outubro, em Lisboa, um plenário conjunto, para apreciação deste processo legislativo e do processo negocial que, obrigatoriamente, o Governo terá que promover.

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